Definição de Orgulho | Estória para não embalar
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© Luca Ferrari |
Escrito para o Photsoc, Festival Internacional da Fotografia social de Sarcelles, 2008, inspirado pela fotografia de Luca Ferrari.
Publicado no livro Pour une poignées de rêves (2013)
Estão todos malucos.
Ou talvez sou eu,
o louco, porque não compreendi nada. Não compreendi a verdadeira definição da
palavra “orgulho”. A do dicionário que diz que é um “sentimento elevado do seu
próprio valor” está desactualizada. Hoje, “orgulho” é uma palavra banalizada,
usada para mostrar que não se tem vergonha. “Tenho orgulho em ser negro”, “tenho
orgulho em ser americano”, “tenho orgulho em ser homosexual”. Falar de orgulho
é como uma arma, usada contra os obstáculos, contra os preconceitos. Vocês não
gostam de mim porque sou assim, mas eu tenho orgulho de o ser.
Não quer dizer
nada.
Não tenho razão
de ter orgulho da minha identidade.
Será que tenho de
ter orgulho de ser um homem, quando tinha 50% de chances de ser uma mulher?
Será que tenho de
ter orgulho da cor da minha pele, quando a genética não me pediu a minha
opinião?
Será que tenho de
ter orgulho da nacionalidade que eu não escolhi?
Se tivesse tido
escolha, seria hoje um loiro de olhos azuis na Islândia?
Ou um cavaleiro
na Mongólia?
Não tenho
orgulho, mas não tenho vergonha.
Na volta sou eu
que não compreendo a verdadeira noção da palavra, que não compreendo a força e
a luta por detrás dela.
Como era, na
época da minha avó? Mulher, africana, pobre e analfabeta? Negra de um império
colonial? Tinha ela orgulho do seu estado? Tinha ela orgulho de ser negra
durante as guerras de independência? Tinha ela orgulho de ser africana durante
os desejos de nacionalismos? Ou, ao contrário, como eu, não tinha vergonha de
quem ela era?
Que pensaria ela
hoje se ela visse os seus filhos e os filhos dos outros atrás dessas grades de
arrogância e de vaidade, gritando palavras que compreendem pela metade? A cor
da nossa pele é a primeira coisa que se vê, mas ela não faz de nós quem nós realmente
somos. Sangue, lágrimas e suor caíram nas palavras, nas algemas, nas
manifestações, nas vontades... e nos orgulhos.
Mas na volta, não
é orgulho.
É dignidade.